COMPREENDENDO A NECESSIDADE DA COMPRA DE INSUMOS

Os insumos para recarga de munições são elementos essenciais na prática de tiro desportivo. No entanto, a implementação do Decreto 11.615/2023 levanta questões pertinentes quanto à aquisição desses insumos. De acordo com o artigo 2, inciso XXIX do decreto, os insumos para recarga são especificamente definidos como “os materiais utilizados para a carga de cartuchos, incluindo o estojo, a espoleta, a pólvora ou outra forma de carga propulsora, e o projétil […]”.

Os insumos atualmente são classificados como Produtos Controlados pelo Exército (PCE), conforme a Portaria Colog 118 de 2019, que apresenta a lista completa de todos os PCE. A designação de um produto como PCE implica em um processo de aquisição específico para cada tipo de produto. Dessa forma, é importante entender como esse processo de aquisição se desenvolve à luz do novo decreto.

Quantidades Determinadas pelo Decreto 11.615/2023

Antes de nos aprofundarmos no processo de aquisição, é importante entender quem está qualificado para adquirir insumos e quais são os limites estabelecidos pelo Decreto 11.615/2023. Este decreto reintroduz o conceito de níveis de atiradores, uma estrutura similar à que era empregada pela Portaria Colog 51 de 2015 entre os anos de 2015 e 2019.

Essa Portaria classificava os atiradores em três níveis, com base em sua frequência de treinamentos, competições e a abrangência regional dessas competições. Por agora, focaremos na categorização de níveis e os respectivos limites de aquisição definidos.

De acordo com o artigo 37 do Decreto, para os calibres que podem ser recarregados, os limites de compra anuais são os seguintes, por atirador:

  1. Nível 1: permissão para adquirir até 4.000 cartuchos;
  2. Nível 2: permissão para adquirir até 10.000 cartuchos;
  3. Nível 3: permissão para adquirir até 20.000 cartuchos.

A palavra “cartucho”, originada do francês “cartouche”, é usada para se referir a uma munição completa, composta por quatro componentes: estojo, carga propulsora (ou pólvora), espoleta e projétil. Deste modo, é possível inferir que a quantidade máxima permitida de cartuchos é equivalente ao número de unidades de cada componente de insumo.

Para esclarecer, veja a tabela abaixo:

NívelProjétilEspoletaEstojoTotal de Cartuchos
14.0004.0004.0004.000
210.00010.00010.00010.000
320.00020.00020.00020.000

Contudo, a quantidade de pólvora necessária para a produção de munições é variável. Dependendo do calibre, um quilo de pólvora pode render entre 5.000 a 300 munições. Devido a essa variabilidade, a regulamentação das quantidades de pólvora é normalmente definida por portarias editadas pelo Comando do Exército.

Determinação da Quantidade de Pólvora

A pólvora, um componente crítico para a recarga de munições, apresenta um desafio ao tentarmos estabelecer limites de aquisição. De acordo com a antiga Portaria Colog 51, os limites de pólvora eram estabelecidos em 4, 8 e 12 quilos para os níveis 1, 2 e 3 respectivamente. Isso sugere que a quantidade de pólvora é geralmente medida na escala de “1 quilo”.

Contudo, a definição exata desses limites ainda não foi estabelecida sob o Decreto 11.615/2023. Podemos, contudo, especular que em um cenário conservador (ou “pessimista”), os limites seriam de 2, 4 e 6 quilos para cada nível, respectivamente. Já em uma projeção mais otimista, poderíamos esperar a manutenção das mesmas quantidades estipuladas pela Portaria Colog 51, ou seja, 4, 8 e 12 quilos.

Dada a atual indefinição regulatória, é recomendado que as empresas que comercializam pólvora operem com as quantidades mais conservadoras para evitar potenciais desconformidades com futuras normativas, por mais incerto que o panorama legislativo possa parecer.

Importante notar, no entanto, que os decretos em vigor não definem uma norma específica para a quantidade de pólvora a ser vendida. Portanto, a legislação complementar vigente é aplicada – neste caso, a Portaria Colog 136 de 2019. 

De acordo com o Art. 36 desta Portaria:

§1º A quantidade anual de pólvora é de até vinte quilogramas por pessoa registrada no Exército.

Legalmente falando, esse limite de 20 quilos é a quantidade máxima permitida por atirador desportivo. Mesmo que a Portaria Colog 136 regule aspectos do Decreto nº 9.846/2019, que foi revogado em janeiro, o Artigo 36 permanece válido na ausência de novos limites estabelecidos pelos decretos recentes, desde que não contradiga qualquer outra legislação em vigor.

Portanto, de acordo com o princípio da legalidade, as empresas podem vender até 20 quilos de pólvora por Certificado de Registro (CR). Entretanto, uma interpretação mais restritiva, que tenta compreender a intenção legislativa por trás da limitação, considera os 20 quilos como um limite para o nível 3, e divide essa quantidade proporcionalmente entre os outros níveis de permissão.

A Verificação de Nível: Responsabilidades e Obrigações

Conforme estipulado na Portaria Colog 150 de 2019, cabe à entidade desportiva verificar a regularidade dos atiradores, conforme previsto no artigo 13: 

“A regularidade deve ser verificada pela entidade de prática e/ou administração do tiro ao qual o atirador desportivo está vinculado, e deve ser fundamentada nas informações registradas de regularidade […]”.

Isso significa que a entidade desportiva é responsável por monitorar a frequência dos treinos e competições dos atiradores e deve fornecer um certificado atestando a conformidade do atirador com os requisitos para o nível de classificação correspondente. Este certificado deve ser preciso e confiável, sob risco de ser considerado falsidade ideológica, um delito criminal punido pelo nosso Código Penal.

Nas situações em que a legislação não fornece diretrizes específicas, é responsabilidade da entidade privada desenvolver mecanismos que garantam a aderência à lei vigente, desde que estes não contradigam o ordenamento jurídico existente.

Por outro lado, os atiradores desportivos têm a obrigação de cumprir os requisitos necessários para que a entidade possa emitir o documento que ateste seu nível de atividade. Desta forma, todos os envolvidos trabalham em conjunto para garantir a transparência e a conformidade legal na aquisição destes insumos que tem um procedimento próprio.

Compreendendo o Processo de Aquisição de Insumos por Atiradores Desportivos: Orientações e Normativas

O termo “Produto Controlado pelo Exército” (PCE) descreve uma categoria de itens que são regulamentados de maneira rigorosa. Este controle abrange todas as etapas, desde a compra, venda, fabricação, importação, exportação até o armazenamento dos PCEs. Geralmente, a importação de PCE necessita de uma Licença de Importação, prévia ao embarque no exterior, já a aquisição em território nacional requer uma autorização prévia à efetivação da compra.

Cada PCE possui um processo específico de comercialização. No caso de armas de fogo, por exemplo, a autorização de compra e o Certificado de Registro de Arma de Fogo (CRAF) são pré-requisitos para que o cliente possa receber o produto. Por outro lado, para equipamentos como prensas de recarga, apenas a autorização de compra é necessária.

Quanto aos insumos, o processo de aquisição é explicitado pela normativa vigente, a Portaria Colog 136, que detalha de maneira clara o procedimento para compra desses produtos:

Art. 35. A aquisição de munição ou insumos de uso permitido ou restrito, para uso em tiro desportivo ou caça, dar-se-á pela apresentação ao fornecedor:

I – de documento de identificação válido;

II – do CRAF da arma; e

III – do Certificado de Registro (CR) de atirador desportivo ou caçador.

Parágrafo único. A aquisição deve corresponder ao calibre da arma de fogo registrada.

Portanto, a aquisição de insumos não exige um processo adicional para a solicitação de autorização prévia. O procedimento de compra já é estabelecido pela Portaria Colog 136, e as quantidades que podem ser adquiridas são definidas pelo Decreto 11.615/2023. Salienta-se que as quantidades adquiridas devem estar em conformidade com a declaração de nível fornecida pela entidade esportiva, um documento que deve ser apresentado ao fornecedor, sendo incluído no dossiê destinado à aquisição.

A negociação de compra, fica vinculada aos limites do nível do atirador desportivo, ocorre exclusivamente entre o fornecedor e o cliente, que deve estar devidamente equipado com toda a documentação necessária.

É responsabilidade do atirador desportivo monitorar a quantidade adquirida. Ultrapassar o limite estabelecido é considerado uma infração no manuseio de Produtos Controlados pelo Exército (PCEs) e pode levar a sanções aplicáveis. No entanto, há um provisionamento para aquisições que excedam este limite.

Na próxima seção, examinaremos mais de perto como o Decreto 11.615/2023 lida com tais situações excepcionais.

Aquisição de Insumos Além do Limite Estabelecido

Para atiradores de alto rendimento, o limite de 20 mil munições por ano estabelecido pelo Decreto 11.615/2023 pode se mostrar insuficiente. Ciente dessa demanda, o legislador incluiu no referido Decreto uma cláusula que permite a aquisição de munições além do limite estabelecido, desde que a necessidade seja comprovada e avaliada pelo Comando do Exército.

Embora o texto do Decreto não mencione explicitamente insumos nesta cláusula, é razoável inferir por analogia que eles se enquadram na mesma categoria dos cartuchos finalizados. Isto se justifica pela quantidade máxima permitida para cartuchos e insumos ser a mesma, indicando que o legislador considerou ambos como equivalentes para fins desta regulamentação.

O Art. 37, parágrafo 5º do Decreto 11.615/2023 diz:

“Para os atiradores de nível 3, mediante comprovação de necessidade associada ao treinamento ou à participação em competições, o Comando do Exército poderá autorizar, motivadamente, a aquisição de armas de uso permitido e de suas munições em quantidade superior aos limites estabelecidos no art. 36 e neste artigo.”

Portanto, para estes casos específicos, a compra de insumos além do limite requer uma avaliação prévia submetida ao Comando do Exército, normalmente à Região Militar de vinculação do atleta ou à organização militar correspondente. Caso a autoridade competente concorde e autorize a solicitação, o atirador, munido da autorização de compra, poderá realizar a aquisição, e a loja estará legalmente autorizada para realizar a venda.

Sobre Outras Categorias de Aquisição

Antes de concluir, é importante esclarecer que este artigo focou na análise das regras e procedimentos estabelecidos pelo Decreto 11.615/2023, aplicáveis especificamente à aquisição de insumos por atiradores desportivos. Contudo, vale entender que a dinâmica de aquisição de insumos se estende a um conjunto mais amplo de agentes e entidades, tais como clubes de tiro, empresas e outras instituições, cada qual com suas particularidades e requisitos específicos.

A aquisição de insumos por estas outras entidades apresenta suas próprias nuances e complexidades que, embora igualmente relevantes, vão além do escopo deste artigo. Assim sendo, nos comprometemos a abordar esses aspectos adicionais em futuros textos, dedicando a eles a mesma atenção detalhada, a fim de fornecer uma compreensão mais completa sobre a dinâmica da aquisição de insumos sob a perspectiva do Decreto 11.615/2023.

Conclusão

Os insumos para recarga de munição, considerados Produtos Controlados pelo Exército (PCEs), podem ser adquiridos em estabelecimentos que têm a devida autorização do Comando do Exército. Tais estabelecimentos são orientados a seguir rigorosamente as diretrizes e limites estabelecidos pelo Decreto 11.615, de 21 de julho de 2023, quanto à quantidade de insumos fornecidos aos atiradores desportivos, em conformidade com os níveis legais.

Vale enfatizar que, para os insumos, não é necessária autorização prévia para a aquisição, desde que se respeite os limites estabelecidos por lei para cada nível de atiradores. O processo de aquisição envolve apenas o contato dos atiradores com um dos estabelecimentos autorizados e a apresentação da documentação exigida.

Conforme nossa análise do Decreto 11.615/2023, o processo de aquisição de insumos se mantém seguro e bem estruturado. O ecossistema legislativo que vigora, fornece diretrizes claras para empresas e atiradores, estabelecendo parâmetros para o exercício da atividade comercial de maneira transparente e segura.

No entanto, é fundamental que ambas as partes – fornecedores e atiradores – cumpram rigorosamente as normas e regulamentos estabelecidos, incluindo as quantidades anuais permitidas, a necessidade de documentação correta e o respeito aos níveis de atiradores e suas limitações correspondentes.

Para situações em que seja necessário adquirir insumos além dos limites estabelecidos, o atirador deve buscar autorização expressa das autoridades competentes, apresentando argumentos sólidos para tal solicitação.

Em conclusão, o panorama regulatório em vigor configura um arcabouço jurídico robusto para o setor, propiciando um ambiente transparente e seguro para todas as partes envolvidas. No entanto, é imprescindível a observância estrita dessas diretrizes para assegurar a conformidade legal e sustentar a integridade inerente à atividade de recarga para o esporte.